O que sua guardiã faz quando não consegue dormir
Desde que Yrsa havia chegado na guarda de Eel, suas noites de sono foram substituídas por uma ansiedade sem fim que grudava na sua pele tão arduamente que era dificil de sair.
Ela se via deitada no seu quarto, olhando para o teto, para as paredes sem janelas. Se sentia enclausurada, com medo do amanhã.
Estar em um lugar completamente novo, com gente completamente nova, era quase tenebroso para ela que era horrível em fazer amizades.
Cada dia que passava no QG, ela se perguntava como tinha feito amigos na cidade de Calail e percebeu que suas amizades em Calail foram feitas desde a infância, quando a vida era menos complicada e fazer amigos novos é tão fácil como respirar. Com certeza, é muito mais difícil fazer amizades quando se é adulto e tem medo do que vão pensar de você, ainda mais chegando como novata em um lugar onde todos já tinham formado seus grupos e eram extremamente seletivos em quem deixavam entrar neles.
Ela sempre atribuia a dificuldade de chegarem perto dela à sua pele parcialmente congelada e ao seu cabelo cheio e longo demais, talvez ela fosse esquisita demais? Ela não sabia, mas a insegurança apitava sempre que ela pensava em chegar em alguém; suas mãos suavam, suas pernas tremiam e ela achava muito mais fácil lutar com um dragão do que se sentar em uma mesa cheia pra ver se fazia amigos no salão.
Nesse momento, quando seus pensamentos se recusavam a dar qualquer trega, Yrsa levantava da cama e vagueava pelo QG vazio a noite, se aventurava na despensa para conseguir um copo de água, e observava as estrelas pelas janelas grandes, percebendo que não fazia a menor ideia de que, se aquilo que ela olhava era uma constelação, ela não fazia ideia de qual era. Seus pensamentos se misturaram para um momento de reflexão onde ela se perguntou se deveria estudar sobre as estrelas, talvez fosse muito útil algum dia.
O copo de vidro é deixado no mesmo lugar onde ela pegou e, mais uma vez, ela respira o ar da noite que entra por brechas que não se conhece, e aproveita o silêncio, desejando que aquela ausência de barulho fizesse eco na sua cabeça para que ela conseguisse dormir em paz.
Então, percebe que não esta sozinha quando vê um pequeno bebê alcopafel se aproximar com os olhos brilhantes em sua direção.
Ela não resiste em fazer um carinho no bebê, que deve ter aproveitado aquele momento para dar um passeio, assim como ela.
- Também não consegue dormir, pequeno? - ela pergunta gentilmente, se agachando e abraçando o pequeno mascote pelo pescoço, cheirando a penugem dele antes de se afastar.
O pequeno faz menção de ir embora, mas para pra olhar pra trás, como se perguntasse se ela também não iria dormir.
Ela sorri mais uma vez e da de ombros.
- Melhor, antes que Jamon me leve a força - o sussurro no silêncio é avassalador e, por isso, ela trata de seguir logo seu rumo antes que o Jamon a veja.
O Alcopafel a guia para o corredor das guarda, para na frente de uma porta e pisca lentamente em sua direção antes de sumir por uma portinhola construída pra ele na porta do quarto. Yrsa interpretou isso como um boa noite e pensa que, quando ele crescer, aquele buraco vai ter que aumentar.
E depois de se despedir da companhia fulgaz daquela noite, ela percebe que nada do que fez, pra ver se o sono voltava, adiantou. Viraria a noite naquela ansiedade extrema de um futuro incerto e um medo de um amanhã cheio de expectativas.
O QG não estava sendo como ela sonhou que fosse.
"Seria mais fácil se soubessem que sou filha de Valkyon?"
Ela se pergunta, enquanto os dedos congelados raspam na parede a medida que ela se aproxima de sua porta.
Em Calail, ela era uma aspirante a guerreira prodígio. No QG, ela era apenas a recém chegada estranha que já tinha arrumado desavença com um dos membros da guarda reluzente - Ezarel.
- Não é minha culpa se ele é um imbecil - ela resmunga para si mesma, fechando a porta do quarto ao passar e se jogando na cama, virando de lado encarando a parede na sua frente.
A ansiedade de um novo dia, as missões que ela faria, tudo girava na sua cabeça naquele momento que, no dia seguinte, iria parecer apenas três segundos para os que tivessem muito cansados, mas que, pra ela, cada segundo foi passado em um sofrimento interminável de pensamentos que não paravam.
Pensou que precisava urgentemente de uma missão. Algo que a deixasse tão cansada que ela só pensasse em dormir quando chegasse no seu quarto.
As vezes, desejava ter um mascote pra conversar, mas só de pensar nisso, as imagens de Frodo morto apareciam na sua cabeça e ela balançava-a negando a si mesma aquela responsabilidade de novo.
- Amanhã, vou treinar até meus ossos pedirem socorro e só vou parar se desmaiar. Ewelein quem não vai ficar nada feliz de me ver na enfermaria, mas, infelizmente, é o único jeito que estou vendo de conseguir dormir.
Mais uma vez, ela se vira para o teto. Um bico nos lábios se forma.
- Antes de um mascote, seria bem legal fazer um amigo também.
Mas ela deixou essa missão, que ela considerava impossível, para o dia seguinte que já chegava.
Em algum momento da noite, ela conseguiu dormir, ela não sabe quando, mas ela agradeceu por isso.
Mesmo que tenha acordado com mais sono do que lembrava ter tido durante a noite. Ela nunca iria entender porque ela acordava mais cansada do que quando estava quando foi dormir. Queria que esse cansaço todo fosse na hora que tinha que dormir e não quando tinha que acordar.
Suspirou, sabendo que seu cabelo sequer bagunçou durante a noite e sentindo a roupa, leve, grudar no corpo pelo suor da noite quente das terras de Eel.
Mas agora, pelo menos, era hora do café da manhã e ela precisava do seu café balanceado. Logo depois, é claro, da oração que sempre fazia ao acordar.
A oração do seu povo que era passada de geração em geração e que pedia proteção aos espíritos dos mascotes.